sexta-feira, 27 de março de 2009

São namoradas?

Sexta-feira acordei decidida a mandar a gangue do mal pro inferno. Tomei um bom banho, e parti para a última aula da semana.
Aula com um cara bem novo, devia estar beirando os 30. Muito comunicativo, fez a aula seguir sem nem percebermos. Olavo era o nome dele. Já deu uma série de livros para lermos. Enquanto estava anotando a lista deixei sem querer cair minha caneta no chão, perto de onde a loira punk/rock estava sentada.
Cutuquei ela timidamente. Não sei de onde veio essa timidez repentina. Depois que terminara com Patrícia havia me transformado em outra pessoa, alguém mais espontânea. Havia perdido certas coisas essenciais sobre mim ao vê-la partir [ou talvez fosse mais correto dizer, ao deixá-la partir].
Ela virou para traz.
- Ãhn?
- Me alcança a caneta, ali embaixo por favor? - sorri - Obrigada - sorri novamente quando ela me entregou a caneta.
- De nada - devolveu o sorriso. Percebi no seu pulso uma pulseirinha muito incomum. Feita de miçangas, formavam um arco-íris. Aumentei ainda mais o meu sorriso, era da parada gay do ano passado, eu também tinha uma dessas.
Existe aquela lei da atração, dos opostos, enfim. To começando a achar que ela não vale quando se está no universo paralelo dos gays. Ou eu estava vendo de mais, ou a população ativamente gay do estado estava aumentado.
No término da aula, topei com a punk/rock, e pedindo desculpas, ela puxou conversa:
- Legal essa aula né?
- É..
- Eu vi você ontem com um balde e uma vassoura, os caras não deixam escapar nada né?
-Não - sorri pensando que daqui a pouco algum apareceria.
- Boa sorte - disse ela entrando em outro corredor.
Segui andando sem olhar para os lados, caso o Paulinho ou o Magrelo me visse.
Ainda não acreditando que ninguém havia vindo falar comigo com mais surpresas, dei de cara com a japonesinha. Tentei dar meia volta, mas ela me chamou.
- E aí, pronta pra mais? - perguntou ela. Dessa vez ela estava sozinha. Pensamentos obscuros me passaram pela cabeça, eu poderia dar um chute nela e sair correndo. Mas ela era uma menina, né? E aprendemos na escola que em mulher não se bate nem com pétalas de rosas, blá blá blá.
- Que que é dessa vez?
- Calma lindinha - sorriu - O que você vai fazer hoje?
- Porque, querem me incumbir de mais alguma coisa? - perguntei rispidamente.
Ela apenas sorriu.
- Hoje você vai ter uma folga.
- Graças a Deus - falei levantando minhas mãos para o céu.
- Mas antes vai ter que me ajudar a carregar umas coisas.
- Que coisas? - já desfazendo o meu sorriso.
- Vem comigo.
- Você ta achando mesmo que eu agora virei serviçal?
Gargalhou gostosamente - Nunca disse isso, estou apenas pedindo um favor, não está vendo o meu braço machucado?
- Agora você se machuca brincando de pique - esconde e eu tenho culpa?
- Vai ter culpa se me deixar carregar coisas pesadas enquanto estou debilitada.
- Sei. Não tenho muita opção né?
- Eu acho que não - sorriu já começando a caminhar - Consegui te roubar dos meninos por enquanto, você decide se quer ir com eles ou comigo - sorriu agora com um ar que se não fosse pelo forte sol que batia em minha cabeça, diria que estava flertando comigo.
- Ta muito quente né? - tentei puxar assunto, já me arrependendo de ter falado tamanha besteira.
- É sim, ótimo pra tomar um banho de piscina.
- Quem me dera ter uma piscina agora.
- A Carol tem um tio que tem piscina, lembra da Carol né?
- Sim, sim. Que bom pra ela então né? Que pena que você não pode tomar banho com o braço assim - sorri ironicamente.
Ela riu.
- Como que tava a festa sábado?
- Que festa?
- Vocês não iam numa festa sábado, depois de me levarem pra minha casa, ou era só pretexto para não me fazer mais companhia?
- Ah é - disse ela colocando a mão na cabeça - verdade. Estava normal, bebida, amigos..
- Namorado.. - falei arriscando - e instantaneamente me senti um homem daqueles que chegam dizendo "e ai princesa, vem sempre aqui?".
Ela novamente apenas sorriu.
- Aqui - disse ela. Entramos no prédio de arquitetura. Muito bonito e grande ele. Subimos uma série de escadas até chegarmos a uma sala meio escondida no final do corredor.
- Onde você está me levando - falei brincando com um tom de medo.
Ela sorriu.
- Entra aí.
Entrei na sala. Era muito mal iluminada e cheirava a mofo.
- Você ta vendo essas caixas em cima da mesa? Me ajuda a carregá-las.
Aparentemente eram leves, mas com o passar do tempo estavam quase caindo de tão pesadas. Mais difícil ainda era descer as escadas com aquele peso, e as pessoas caminhando como se eu não estivesse ali, parecia até que achavam que poderiam passar por dentro de mim. Quando eu disse "Então derruba", a menina que trombou comigo ainda quis me chamar de "estúpida", vontade de tocar a caixa na cabeça dela não me faltou.
- O carro é perto - disse ela segurando duas chapas de isopor.
- Que bom, porque isso aqui nem ta pesado - falei sem fôlego - O que tem dentro? Corpos?
- Segredo.
Chegamos num corsa branco. Reconheci de cara as duas meninas que estavam se abraçando encostadas no carro. Carol e Má. Logo elas se beijaram, ali, no estacionamento, ao ar livre e todos ao seu redor nem fizeram cara de espanto ou coisa parecida. Realmente não estava mas na minha cidade. Respirei aliviada, senti um gosto de liberdade.
Antes de chegarmos perguntei:
- Elas são namoradas?
- Por quê? Na sua cidade não existe isso? - disse ela rindo, me olhando aguardando a minha resposta.
Arqueei minha sobrancelha e apenas devolvi um sorriso pra ela.

2 comentários:

Uma fã qlqr disse...

Hum...
emocionante!
aguardando mais e mais...

Olga disse...

Quem dera se eu puder sentir essa "liberdade" quando me mudar pra cursar a universidade que eu quero! Vivo numa cidade extremamente católica e conservadora. Teve uma parada gay aqui no ano passado, nem sei como conseguiram.