domingo, 3 de maio de 2009
Antes do dois
Desde o episódio em que quebramos o quadro da tia Med já havia se passadoe quase 5 meses e esses momentos em que ficávamos inesperadamente constrangidas uma com a outra se repetiam com maior freqüência. Às vezes nossas mãos se encostavam e ficávamos paradas apenas sentindo aquela coisa estranha que começava pelo coração e ia descendo pela barriga. Nós que sempre contávamos tudo uma para a outra, nem sequer tocávamos nesse assunto. Achava que talvez aquilo fosse tão normal que era por isso que nem conversávamos sobre. Cada dia as sensações aumentavam e ficava mais difícil de entender o que se passava. No começo da oitava série, ainda com treze anos, nos distanciamos um pouco. Era muito complicado lidar com aquela bomba de emoções. Mas sempre que nos víamos, aquela coisinha que parecia já ter terminado, voltava com mais vontade do que antes. Assim fomos levando até o dia do meu aniversário. Estavam poucas pessoas na minha pequena festa que ocorrera na própria casa da tia Med. Todos já tinham ido embora, e Patrícia e eu fomos para o quarto ver novamente os meus presentes. Não acreditando que tia Med havia me dado uma Barbie, mesmo sabendo que eu não gostava de brincar com ela, nossas mãos se tocaram ao pegar a caixinha que ela viera. As duas ficaram envergonhadas, mas continuaram na mesma posição, sem se mexer. Resolvi me aproximar dela, sem pensar em mais nada. Meu coração já não estava mais dentro de mim, poderia estar em qualquer lugar, provavelmente na minha garganta pois não conseguia falar nada. Ela permanecia me olhando, com um brilho estranho no olhar. Esse brilho que agora aparecia sempre que estávamos juntas. Não sabia dizer quem estava mais nervosa, nossas mãos tremiam tanto, mas talvez justamente por isso a caixinha não aparentava estar se mexendo, uma mão anulava a outra. Era difícil controlar minha respiração. Meu coração eu já tinha perdido o controle. Ela fechara seus olhos, se aproximando de mim. E assim, naquele jeito, sem conseguir controlar meu coração nem minha respiração, com a mão suando de nervosismo, com meu coração batendo mais forte ainda, com minha vergonha dando espaço para minha vontade, levei minha boca até a dela. Era o primeiro beijo que eu dava em alguém. Era o primeiro beijo que ela dava em alguém. Era o nosso primeiro beijo. Sua boca estava quente e úmida. Ao sentir sua língua na minha estremeci. Concordo que foi desajeitado, mais saliva do que qualquer outra coisa, afinal enquanto nossas coleguinhas estavam lendo Capricho e aprendendo as 25 formas de beijar, nós estávamos jogando futebol na rua. Nossos dentes se tocaram de leve, nosso nariz se tocou de leve. O beijo foi longo, levou o tempo suficiente para meu coração sair da garganta e descer para barriga. Nossas mãos ainda seguravam firme o pacote de presente. Após o beijo ainda fiquei com os olhos fechados. Ficamos paradas a poucos cm de distância uma da outra. Sentia que ela também estava de olhos fechados. Permanecemos assim durante muito tempo. Abrimos nossos olhos ao mesmo tempo, mas a timidez de Patrícia tomou conta dela, e ela saiu correndo quarto a fora. Aquela noite foi especialmente diferente. Tirando o medo, pânico mesmo, nervosismo e o pavor do acontecimento, ainda achei o melhor presente de aniversário que poderia ganhar. Mesmo não entendendo absolutamente nada do que estava acontecendo com a gente, talvez as aulas sobre sexualidade estavam demorando de mais para ocorrerem, eu não conseguia parar de pensar naquele beijo. E sentia que precisava entender o que se passava com a gente. Eu havia dado o meu primeiro beijo e enquanto as outras meninas na escola sonhavam com o príncipe encantado, meu príncipe era uma... uma princesa? Como seria chegar na aula no outro dia e ter de encarar Patrícia?
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