Eu tinha lá meus treze anos. Depois da aula de manhã sexta-feira, como sempre fazíamos, fomos almoçar no restaurante da tia de Patrícia. Fomos para minha casa olhar televisão e conversar, como também era de costume. Mas naquele dia havia acordado diferente. Naquele dia havia sonhado com Patrícia, mas era um sonho diferente. Nele nós nos beijávamos. Fiquei muito tempo pensando naquele sonho, e estava me sentindo mal em ficar perto dela. Ela estava feliz que as férias de julho haviam chegado que nem percebera a minha distância. Tentando me chamar atenção, tocou um travesseiro em mim, e logo começara uma guerra, valia tudo, travesseiro, estojo, mochila, até quebrarmos um quadro que estava pendurado na parede. Era um dos quadros que minha tia havia pintado, sabe aqueles quadros de flor?, aqueles mesmo que todo mundo sabe fazer, de flores que nem existem, e que com misturas de cores, acabam por ficar até que bonitinhos? Pois então, e era um dos preferidos da tia Med. Tentamos desesperadamente consertá-lo, mas não conseguindo começamos a rir sem parar, já consoladas pelo castigo próspero. Nunca me esqueço, ela estava com seu habitual jeans surrado (na época que não era vendido na Renner e C&A), All Star (na época que emos ainda não usavam All Star) e camiseta branca (na época que todo adolescente tem de gostar de Ramones e de querer ser rebelde). Ao ouvir a porta se abrir, sabendo que era minha tia chegando, deitamos rapidamente na cama e fingimos estar olhando o filme que passava na Sessão da Tarde. Tia Med entrou no quarto e deu seu oi de sempre: sem vontade e sem graça. Quando ela fechou a porta desandamos a rir novamente. Dessa vez nossos rostos se tocaram e ficamos nos olhando. Senti pela primeira vez o meu coração bater acelerado e minhas mãos gelarem, suando frio. Tentei fazer força para achar que era porque havíamos quebrado o quadro. Ficamos em um silêncio nervoso durante alguns minutos.
- Eu quero ser sua amiga para sempre Manu.
- Mas nós vamos ser - falei tentando disfarçar meu nervosismo pela situação.
Tia Med entrou no quarto para perguntar se nós queríamos pipoca, que naquele dia ela estava muito boazinha. Demos um pulo na cama tão grande, que ela pensou que estávamos aprontando alguma coisa. Logo descobriu que o quadro estava em mil pedaços. Fiquei de castigo durante uma semana. Justamente nas férias. No primeiro final de semana já sentia muito a falta de Patrícia. Ela conseguiu me visitar terça-feira a tarde. Esperando minha tia sair, para sua habitual ida à Igreja onde ajudava na paróquia, tocou pedrinhas na minha janela para me chamar. Ficamos conversando a tarde inteira, dessa vez fiz questão de não ficar muito perto dela. Estava com medo das coisas estranhas que sentia quando ficavamos perto. Nunca havia conversado com ninguém sobre gays. Para mim isso era coisa de televisão. Sabia que existia, mas não sabia o que era. Por isso não sabia dizer para ninguém o que eu sentia e também não sabia se era recíproco. Talvez isso fosse normal. Era? Mas porque nunca havia ouvido nenhuma das minhas colegas falarem disso? Um pouco antes da minha tia chegar, nos despedimos rapidamente para ela não ver Patrícia. Quando ela me deu um beijo no rosto senti que suas bochechas estavam vermelhas. Saiu correndo com o pretexto de que tinha visto uma mulher parecida com Med. Era estranho mas meu coração batia forte, e dessa vez sabia que não era por causa da minha tia.
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