Fui criada por minha Tia que por não ter mais minha mãe para culpar, transformava toda sua raiva pelo casamento de seu irmão em mim. Colocava a culpa que ela dizia ser da minha mãe tinha pela morte do meu pai em mim. Tudo de ruim era minha culpa, inclusive a vida dela não ter dado certo, como se eu, uma pivetinha de cinco anos pudesse fazer muita coisa por uma mulher já viúva, e agora sem irmão nenhum para aturar suas maluquices. Fiz questão de esquecer tudo que pude dessa minha infância turbolenta, mas havia certas coisas que eu conseguia lembrar com toda a clareza do mundo. Um coisa em espcial. Na verdade uma pessoa.
Lembro que quando coloquei os pés na casa da minha tia, vi pela janela do meu quarto uma menina jogando futebol com vários meninos na ruazinha de paralelepípedo. Fiquei acompanhando seus movimentos, ela certamente era a melhor jogadora dali. Driblava os meninos com muita facilidade, da mesma forma como eles ficavam visivelmente bravos com ela. Eu também gostava de jogar futebol, mas não jogava tão bem quanto ela. Fiquei olhando aquele jogo durante vários minutos, perdendo um pouco da noção de tempo alí. Era lindo ver como aquela menina jogava tão bem. Tomando coragem desci as escadas e fui para a rua ver se pelo menos poderia olhar o jogo mais de perto. Me sentei no cordão da calçada e logo a menina se aproximou de mim.
- Oi - disse ela com o rosto vermelho e suado de tanto jogar.
Mas me senti intimidada por ela e vendo que os meninos também estavam se aproximando de mim saí correndo para dentro de casa. Eu era a filha única, nunca tive muitos amigos. Era só o meu pai e eu. Minha mãe estava sempre atrás de emprego, entrevistas, já que como ela mesma dizia, não podemos comer nossos sonhos. Tinha medo de outras pessoas, tinha medo de conhecê-las. Toda a tristeza da perda do meu pai e da minha mãe me tornaram uma criaça introvertida e minha tia não ajudava nem um pouco com isso. Mas uma semana depois de ter chegado, resolvi tomar coragem e ir pedir para jogar com os meninos. Com 10 anos a menina e eu não desgrudávamos mais. O nome dela era Patrícia. Minha tia não gostava de me ver sempre suja, jogando futebol, correndo com os meninos. Na época em que as menininhas faziam o grupo da Luluzinha, Patrícia e eu est[avamos correndo por aí, roubando goiabas do vizinho, caçando passarinhos. Foi mais ou menos nessa época que aprendi a não ter vergonha das coisas. Aprendi é modo de dizer, coloquei na minha cabeça. Pois já que estava sozinha no mundo, eu precisaria estar mais comigo, e para isso precisava deixar meus medos para depois. Começava a entender o que meu pai havia me falado naquela noite de lua cheia. Lutar pelas coisas que acreditamos.
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